Artigo analisa impactos de agendas supranacionais no ensino em Cabo Verde, com foco nas reformas curriculares.

O docente e investigador da Faculdade de Educação e Desporto da Universidade de Cabo Verde (Uni-CV), Arlindo Mendes Vieira, publicou recentimente um artigo na revista Journal of Supranational Policies of Education sobre os efeitos da globalização nas políticas curriculares de países subdesenvolvidos, tomando Cabo Verde como estudo de caso.
O estudo, intitulado “Os currículos dos países subdesenvolvidos e a influência da globalização: o caso de Cabo Verde”, propõe uma leitura reflexiva e crítica das reformas educativas em contextos marcados por dependências económicas, políticas, culturais e sociais associadas à globalização. O autor argumenta que, em muitos países, as políticas curriculares não estão adaptadas às realidades nacionais e revelam influência histórica das antigas potências coloniais, refletindo convergências de interesses político-económicos e a difusão de padrões uniformes e de accountability.
No enquadramento teórico, o artigo situa as reformas curriculares na crise estrutural do sistema capitalista neocolonial, salientando a ação de organizações trans e supranacionais e o papel de agendas globalmente estruturadas na orientação de políticas públicas de educação. Referindo autores como Afonso, Pacheco, Dale e Meyer, o artigo discute a tensão entre homogeneização e a identidade local, e defende que a globalização introduz modelos universais que moldam conteúdos e resultados de aprendizagem, frequentemente desalinhados com contextos específicos.
Ao analisar o caso de Cabo Verde, o autor descreve a trajetória das reformas desde meados da década de oitenta, incluindo projetos como PREBA, PRESE e PROMEF, e os diplomas que reconfiguraram o ensino básico e secundário. Identifica uma implementação predominantemente top-down, com margem reduzida para inovação local, e sublinha a persistência de um modelo transmissivo de ensino e de avaliações centradas na memorização, bem como lacunas na atualização de conteúdos face aos avanços científicos e tecnológicos.
O estudo realça, ainda, que a priorização de competências alinhadas ao mercado, por influência de organismos multilaterais e referenciais internacionais, pode acentuar dependências e produzir controlo curricular orientado por resultados. Como pistas de ação, o autor defende a integração de saberes locais, a articulação escola-comunidade e a promoção de competências-chave (trabalho em equipa, uso crítico de informação e tecnologia, cidadania ativa) para responder aos desafios contemporâneos e reforçar a sustentabilidade do sistema de ensino.
Publicado no volume 21 do Journal of Supranational Policies of Education (ISSN 2340-6720), o artigo contribui para o debate sobre regulação curricular em ilhas africanas de pequena dimensão e oferece evidências e interpretações com utilidade para decisores, gestores escolares e docentes envolvidos em processos de revisão curricular e formação de professores.