No dia 12 de julho, a professora da Faculdade de Ciências Sociais, Humanas e Artes da Universidade de Cabo Verde e atual diretora dos Serviços de Documentação e Edições, Maria Salomé Miranda, defendeu, com Distinção e Louvor, a sua tese de doutoramento intitulada “Mulheres e discurso(s) pós-colonial(is): Dimensões sociais e culturais nas obras literárias de Dina Salústio, Odete Semedo e Paulina Chiziane”, pelo Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da Universidade Cabo Verde.
O júri foi composto pelos Professores Doutores Nanduska Palmeira (Presidente - Universidade de Cabo Verde), pelas arguentes Alyxandra Nunes (Universidade do Estado da Bahia-Brasil), Fatime Samb (Universidade Cheikh Anta Diop-Senegal) e Maria Nazareth Fonseca (Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais-Brasil). A orientação científica e metodológica esteve sob a responsabilidade do Professor Doutor Cláudio Alves Furtado (Universidade de Cabo Verde).
Resumo da tese
A trajetória de consciencialização e emancipação das mulheres no continente africano foi (continua a ser) acompanhada de muitos desafios e enfrentamentos ancorados numa perspetiva masculina paternalista que lhes denegara os direitos à igualdade e equidade (em relação aos homens). Mas, também, de outros olhares e novas estratégias que, desde logo, se bateram contra os estereótipos e a subalternização do sujeito feminino e trouxeram novas perspetivas.
No universo das letras africanas, as mulheres têm-se pautado pela busca da afirmação enquanto entidades autónomas, distanciando-se das literaturas ocidentais. São exemplos, as escritoras Dina Salústio (Cabo Verde), Odete Semedo (Guiné-Bissau) e Paulina Chiziane (Moçambique) que se apropriam do género narrativo para discutir e questionar as estratégias discursivas hegemónicas e apresentar uma releitura das suas sociedades, das relações de género (mulher/homem e mulher/mulher) e de um conjunto de aspetos provenientes das culturas étnico-tradicionais que interferem nessas relações e têm influência direta no comportamento das pessoas e na sua visão de mundo.
Esta tese é um trabalho analítico de comparação das produções literárias dessas autoras, que se situam no período pós-independência, e tem o objetivo de analisar as dimensões sociais e culturais nas narrativas de emancipação feminina em Cabo Verde, Guiné-Bissau e Moçambique.
Essa premissa conduziu à perceção de que a subjetividade das mulheres extravasa as narrações dos historiadores ou a reprodução sistemática dos discursos inseridos na cultura e nas produções (literárias ou não). Neste sentido, o desenvolvimento do tema requereu a adoção da metodologia qualitativa comparatista que propõe a interseção das orientações provenientes dos Estudos Culturais, Estudos Pós-coloniais, Estudos Literários e Estudos Comparados e observa as possibilidades de diálogo entre as teorias pós-coloniais, a cultura e os estudos feministas a partir da análise das obras.
Essa metodologia comprovou que não obstante as linhas de força comuns entre as autoras, o seu percurso de vida e as narrativas testemunharem uma visão unificadora dos textos produzidos por mãos femininas não deixam de ser evidentes as particularidades de cada uma dessas literaturas suportadas pelas culturas específicas de cada povo.
As obras atestaram que as mulheres continuam a ocupar um lugar de relativa subalternidade em relação aos homens, uma posição que se tornou natural e naturalizada pela aceitação dos seus membros.
A literatura tornou-se um lugar de enunciação privilegiado para as mulheres escritoras onde elas podem desabafar, criar um universo próprio sem proibições, negociar a sua identidade como mulheres e escritoras, contestar e propor estratégias de mudança.
A forma como as escritoras compuseram os perfis das personagens em cada obra, baseando-se na abordagem de género e construíram a sua historicidade, inscreve-se no processo de reconstrução da imagem da mulher nos diferentes contextos que representam e na reescrita da sua história nas sociedades africanas.
Teoricamente este estudo ancorou-se sobretudo nas pesquisas de autoras e autores como Gayatri Spivak, Edward Saïd, Michel Foucault, Pierre Bourdieu, Inocência Mata, Mafalda Leite, Oyèrónkẹ Oyěwùmí, Sunday Bamisile, Chimamanda Adichie e Eduardo Coutinho que enfatizam a abordagem fora do centro hegemónico, no quotidiano dos grupos considerados minoritários onde as mulheres se incluem ou são incluídas.
Palavras-chave: Mulheres, Género, discursos pós-coloniais, escrita de autoria feminina, marginalização, autoafirmação, Estudos Comparados.