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Adilson Silva é professor Investigador da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Cabo Verde desde 2011, natural da Cidade da Praia. Fez a Licenciatura e Mestrado na Universidade de Coimbra, em Portugal em Matemática Pura porque Matemática é a única área que lhe satisfazia. Revelou que os primeiros anos de Licenciatura foram conturbados especialmente devido à falta de uma bolsa na Licenciatura, inclusivamente reprovou logo primeiro ano. Mas mesmo assim não desistiu. Terminou o doutoramento recentemente e já conta com uma patente na área em que atua, uma inovação no sector.

Uni-CV: Fale-nos um pouco sobre o seu percurso académico?

Adilson Silva: Iniciei os estudos do ensino secundário no Liceu Constantino Semedo, do 7º ano até ao 10º ano, depois 11º e 12º ano mudei-me para a Várzea, Liceu Cónego Jacinto, porque no Liceu Constantino Semedo, na altura, não tinha a área de Ciências e Tecnologia. Depois de concluir o ensino secundário, consegui uma vaga na Universidade de Coimbra, em Portugal, para fazer a licenciatura em Matemática Pura. Tínhamos de estudar a Matemática mesmo a fundo, compreendendo muito bem os teoremas e as respetivas demonstrações. A minha licenciatura na Universidade de Coimbra foi um período meio conturbado devido à falta de uma bolsa. Inclusivamente reprovei logo no meu primeiro ano porque não tinha preparação suficiente. O meu ensino secundário não correspondia à exigência que encontrei, apesar de ter sido um dos melhores alunos do Liceu de Achada São Filipe naquela época. No entanto, a universidade para mim foi outro mundo. Depois da Reprovação, aproveitei logo os dois meses de férias para estudar. Tinha que me preparar se queria ultrapassar aquele desafio. Eu não percebia nada da matéria, e os professores constataram isso também, mas sentiram que tinha muita força de vontade. Nas férias eu ia tirar dúvidas e estudar com eles. 

Logo no ano seguinte comecei tudo do zero, mas já com alguma bagagem para puder arrancar.  Dali em diante foi sempre a progredir e acabei por concluir a licenciatura sem bolsa de estudo. Para custear a minha formação de graduação tinha que trabalhar em todas as férias nas obras em Lisboa, com o meu tio, para conseguir dinheiro para vir pagar propinas do ano inteiro; foi mesmo uma batalha enorme. A Faculdade viu que eu era um excelente aluno, mas não podiam dar-me uma bolsa, porque eu só tinha visto de estudante na altura. Ao terminar a licenciatura consegui a residência com a autorização para trabalhar, mas tive a sorte de conseguir candidatar-me a uma bolsa mestrado nos Serviços de Ação Social da Universidade de Coimbra, tendo conseguido obtê-la. Ali já foi uma vida boa, pois a bolsa era de 450€. Fiz o meu mestrado em Matemática Aplicada em 2011, com os recursos dos Serviços de Ação Social da Universidade de Coimbra. 

Logo após terminar o Mestrado, queria começar o doutoramento, mas novamente não consegui bolsa por ter sido o período em que Portugal entrou em crise. Acabaram por cortar todas as bolsas de doutoramento e eu tive que regressar para Cabo Verde. Em Outubro de 2011 comecei a trabalhar na Universidade de Cabo Verde. Tive um ano a trabalhar, mas não me sentia conformado com a situação de estar só a trabalhar, porque tinha tanto o vício dos estudos. 

No ano letivo de 2012/13, consegui uma vaga na Universidade Nova de Lisboa para fazer o doutoramento em Matemática Aplicada. Inscrevi-me e fiz as disciplinas do 1º semestre. Já no 2º semestre tive a licença de serviço de docente e estive tempo inteiro a trabalhar. No ano seguinte, estive a dar aulas na Uni-CV e desde então viajava para Portugal quatro vezes por ano para ter encontros com os meus orientadores e discutir as ideias bases.

Uni-CV: Fez todo o seu percurso dedicado à Matemática. Por que razão?

AS: É uma paixão muito grande desde do liceu. As outras áreas não me satisfaziam, precisava de ir a afundo e só Matemática é que me permitia. Até podia ser a física? Sim, mas entre a física e a matemática decidi pela matemática, porque é que me chamava mais atenção.

 Uni-CV: Em 2011 regressa a Cabo Verde para trabalhar na Universidade de Cabo Verde. O que significa ser docente na Uni-CV? 

AS: Eu tenho que estar ligado a uma Universidade para puder investigar, por isso só a Universidade me satisfaz. Se eu não tivesse esta oportunidade de trabalhar na universidade pública em Cabo Verde, não teria regressado a Cabo Verde. 

Uni-CV: A investigação está sempre à frente da docência?

AS: À frente não, uma coisa leva à outra. Para estar a investigar tenho que estar ligado a uma universidade e tenho que dar aulas. Até costumo dizer que quando um professor investiga e tem dado grandes contributos à área na investiga, não precisa esforçar-se muito para dar aulas, porque o aluno quando sabe que tem uma referência na sala de aula, esforça-se mais. Quando o docente é um investigador nato, publica trabalhos científicos, desenvolve patentes, participa em atividades de extensão, enfim, dá o seu contributo à academia, isso tudo é bem visto na universidade e o estudante é motivado por esse percurso.

Uni-CV: Fale-nos um pouco sobre a sua tese de doutoramento?

AD: A minha tese de doutoramento liga a estatística e a matemática, sabendo que a estatística é a parte da matemática que trabalha com dados e baseia-se em fenómenos aleatórios e fixos. O que eu fiz na minha tese de doutoramento foi basicamente usar o background de matemática que tenho, para desenvolver um método para estimar as componentes de variância nos modelos mistos lineares. Os modelos mistos lineares têm uma base estatística que modela fenómenos de várias áreas desde física, química, economia, biologia, etc. Esses modelos são amplamente aplicados nesses estudos. Já ouviram falar da expressão cluster, são dados agrupados com uma variação deferente dentro dos grupos. O que o nosso método faz é estimar essas variâncias, já há outros métodos que fazem isso e que são muito conhecidos: a máxima verosimilhança e a Anova. Esses dois métodos também fazem estes trabalhos, mas o melhor que há até agora é o de máxima verosimilhança. Só que não funciona muito bem quando há falta de dados ou quando os dados são extremamente limitados, e também não funciona muito bem para certos designs. O nosso método, a que chamamos Sub-D, é uma estrutura de matrizes que funciona lindamente para qualquer um dos designs, variando um pouco mais que a máxima verosimilhança, mas é extremamente centrado; também é polivalente, portanto pensamos tratar-se de um contributo enorme para a área. 

Os biólogos podem querer estudar as características biológicas transmitidas dos galos para os pintos, através das galinhas. Este é um exemplo simples para quem não é da área. Para compreender como as características dos galos são passadas para os pintainhos, começa-se por observar os pintos. Cada grupo de galos é acasalado com um grupo de galinhas, e cada uma dessas galinhas é responsável por um conjunto de pintos. Assim, ao observar os pintos, podemos inferir as características dos galos, pois cada pinto está relacionado com uma galinha e, por sua vez, esta galinha está relacionada com um galo.

Uni-CV: Conte-nos mais sobre esta patente que desenvolveu através do doutoramento? 

AS: A patente dedica-se a estimar estas componentes da variância. Antigamente e até ao presente momento usava-se a nova ou máxima verosimilhança. Desenvolvemos o nosso método e provamos a sua validade na minha tese de doutoramento com fundamento em resultados teóricos. Até agora ainda ninguém conseguiu refutar a nossa patente. Já apresentei os resultados em conferências e já foram publicados em revistas científicas. Tirei a nota máxima na defesa de doutoramento, tendo um dos arguentes dito que não acrescentava nem uma única vírgula na minha tese. O nosso método já está validado, mas usá-lo passará por usar um software. Assim, o que pretendemos agora é desenvolver pacotes que vão ser acrescentados aos softwares da praça (R e MatLab, para já) para implementar esse método que desenvolvemos para que quando alguém, seja investigador, aluno ou mesmo um técnico de uma instituição queira fazer um estudo, possa ter acesso ao método para estimar componentes da variância em determinadas situações. Estamos á procura de financiamento. O grupo é constituído por mim, o meu orientador, o meu co-orientador e um dos elementos da mesa do júri da minha defesa, o arguente principal. Já temos o projeto concluído, tendo submetido a financiamento, estando agora a aguardar os resultados. 

Uni-CV: Quais são os outros projetos que tem em curso?

AS: Agora que acabei o meu doutoramento gostaria de trabalhar com os meus estudantes, desenhar sebentas e livros de carácter didáticos para que possam guiar-se melhor. O meu objetivo é continuar a trabalhar na Uni-CV porque quero dar o meu contributo ao meu país. Mesmo que tenha a proposta de lecionar noutras universidades, até irei, sim, mas como Professor convidado, talvez, não de forma efetiva, pois quero manter-me um quadro da Uni-CV. Trabalhar na Universidade de Cabo Verde é a forma através da qual pretendo dar o meu contributo na Matemática ao meu país. 

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