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Covid-19

Novo coronavírus causador da doença Covid-19: “Estamos a viver a ciência em tempo real”

Por: Neidy V. Rodrigues*

Sistema imunitário (sistema de defesa do organismo)

Todo o indivíduo contém um sistema de defesa (sistema imunitário) responsável por lhe proteger contra diferentes tipos de microrganismo ou toxinas que provocam lesões dos tecidos e órgãos.

Quando um indivíduo é infetado por um patogénico (vírus, bactérias ou fungos) o seu corpo responde e tenta combater a infeção. No caso de a infeção ser provocada por um vírus, o sistema imune produz anticorpos contra o vírus, e após esse combate (entre o anticorpo e o vírus) a informação (resposta) é guardada.

Na próxima vez, que o indivíduo estiver em contacto com o mesmo vírus, o seu corpo irá responder melhor e mais rápido. Esta resposta é denominada de resposta adquirida (memória). Mas isso, não acontece com todos os vírus e nem em todas as pessoas, Porquê?

Os linfócitos (T e B) são responsáveis pela imunidade adquirida.

No corpo, ocorrem dois tipos básicos de imunidade adquirida contra o vírus. A primeira pode ser através da resposta humoral (imunidade de células B), onde acontece a ativação e a diferenciação dos linfócitos B e consequentemente a produção de anticorpos contra o vírus. E a segunda resposta, é denominada de resposta celular (imunidade das células T), este último não produz anticorpos (mas sim, citoquina) e elimina o vírus a partir de ativação de linfócitos T ativados.

Estudos científicos publicados nos prestigiados jornais (Cell e Science) demonstram que os pacientes infetados com o novo coronavírus SARS-CoV-2 produziram anticorpos neutralizantes (proteína que bloqueia a entrada do vírus na célula humana).

Para reforçar, outros estudos demonstraram a eficácia de tratamentos contra a infeção do coronavírus utilizando plasma de pessoas recuperados da doença COVID-19 que conseguiram desenvolver anticorpos neutralizantes contra o coronavírus. A identificação do anticorpo neutralizante eficiente permitirá que se faça o seu isolamento e utilização no tratamento contra coronavírus.

Um estudo publicado no jornal “The New England Journal of Medicine” mostra que os alvos dos anticorpos neutralizantes são a glicoproteína S “sipke” (proteína expressa na superfície do coronavírus). Nessa mesma linha de estudo, os cientistas mostram que, a proteína S é utlizada pelo vírus para invadir as células humanas, e isso ocorre através da ligação entre a proteína S do vírus com a enzima conversora de angiotensina 2 (ACE2) presente em células do epitélio do sistema respiratório humana.

Recentemente, foi publicado no jornal Lancet um estudo para avaliar a tolerância dos indivíduos ao novo candidato à vacina (fase 1), e a sua capacidade de induzir imunidade humoral (produção de anticorpos) e de estimular formação de linfócitos T ativados, onde confirmaram a presença de anticorpos neutralizantes no soro dos indivíduos e ativação dos linfócitos T acompanhada com produção de citoquinas (Fator da necrose tumoral e interferon gama), entre os 14-28 dias após a vacinação.

Porém, nem sempre a resposta a uma infeção pode ser benéfica para o organismo. É possível que o indivíduo, apesar de infetado, não tenha desenvolvido anticorpo neutralizante.

Por outro lado, há outros fenómenos tais como pessoas que apresentam resposta inflamatória exacerbada (prejudicial); fatores de coagulação exacerbados, tempestade de citoquinas (fatores libertados no processo inflamatório), e todos estes fenómenos, poderão estar na base da explicação dos diferentes cenários da manifestação da doença COVID-19 (os casos mais graves e de mortalidades), por isso, há vários desafios pela frente.

Testes de imunidade

Por isso, é importante percebemos, o que são os testes de imunidade e qual é o significado dos seus possíveis resultados.

O teste de imunidade (imunidade adquirida), os chamados “testes rápidos”, que recentemente foram aprovados para serem realizados fora do laboratório, são teste de seropositividade (teste imunológicos).

O teste rápido permite identificar o anticorpo que o seu corpo produz em resposta à infeção contra o coronavírus. Por isso, após o teste rápido positivo, o procedimento seguinte é a realização da técnica RT-PCR (Transcrição reversa seguida de reação em cadeia da polimerase), o teste que pode detetar a presença ou não de quantidades muito pequenas de material genético viral do coronavírus numa amostra, duplicando várias vezes através de um complexo processo laboratorial chamado amplificação. Devido à  sua alta especificidade permite diferenciar o SARS-CoV-2 de outros subtipos de coronavírus que apresentam semelhanças genómicas com o novo coronavírus.

Se o teste do RT-PCR confirmar o resultado positivo, isto indica que o indivíduo ainda está infetado (ativo), e se o resultado for negativo, isso indica que o indivíduo já está recuperado da doença ou seja, que a presença do anticorpo no teste rápido deve-se ao facto de que o indivíduo já esteve contaminado e desenvolveu anticorpos neutralizantes.

Contudo, os testes de imunidade são fundamentais para as políticas de saúde pública de combate à pandemia COVID-19, pois, permite fazer a construção e avaliar a imunidade populacional, e determinar medidas de prevenção, tais como, o distanciamento social seletivo (proteção do grupo de risco); colheita correta das amostras para o diagnóstico, utilização de máscara, desinfeção do corpo e dos objetos, teste de deteção do genoma humano RT-PCR (permite identificar os casos ativos ou seja as pessoas infetadas); e, pro fim, o teste serológico (teste rápidos), permite saber os números de pessoas que tiveram contato com o vírus.

Já existe uma terapêutica aprovada contra o coronavírus?

Não há uma terapêutica aprovada. Em avaliação estão os antivirais (diminuição da replicação de vírus) tais como, remdesivir; medicamentos anti-inflamatórios (Dexametasona); respostas imunitária: o uso de soro de pacientes recuperados (anticorpos neutralizantes); procura de anticorpos neutralizantes e os candidatos a vacina.

Foto: Ilustrando a expressão dos diferentes proteínas na superfície do coronavírus, bem como a interação da glicoproteína S do SARS-CoV-2 com o recetor ACEA-2 nas células humanas.

 

Para quando a vacina?

Para que se perceba, nesse momento, se houvesse uma vacina contra o coronavírus, um teste rápido positivo poderia indicar que a pessoa foi vacinado e desenvolveu anticorpo neutralizante contra o SARS-CoV-2 e não necessariamente infetado. Porquê?

Pois, a maioria das propostas de desenvolvimento das vacinas estão a serem baseadas no mecanismo que o vírus utiliza para invadir as células humanas.

Neste sentido, uma das formas de desenvolver a vacina pode ser através do vírus inativo e fragmentado para produzir antígenos que estimularão a produção de anticorpos neutralizantes contra o coronavírus.

As vacinas reduziram a prevalência de muitas doenças mortais. Funcionam principalmente porque as nossas células defesas (células B e T) têm a capacidade de produzir células de memória. Por isso, se a vacina contra o novo coronavírus estivesse disponível e um indivíduo fosse vacinado, se for submetido a um teste rápido, o resultado seria positivo, e isso não quer dizer que o indivíduo estaria infetado, mas sim que o indivíduo após a vacinação desenvolveu anticorpos contra o coronavírus.

Neste momento há mais de 100 candidatos a vacinas em curso a ser desenvolvidos. De entre os ensaios clínicos em curso, os que apresentam resultados mais avançados são: na fase 2 estão as empresas Moderna/NIAID (Estados Unidos), Anhui Zhifei Longcom Biopharmaceutical/Institute of Microbiology, Chinese Academy of Sciences, BioNTech/Fosun Pharma/ Pfizer (Alemanha), entre outros e, por último, os mais avançados (fase 3) estão Beijing Institute of Biological Products/Sinopharm, Wuhan Institute of Biological Products/Sinopharm, empresa Chinesa-Sinovac, Universidade de Melbourne/Murdoch Children’s Research Institute e a Universidade Oxford juntamente com a empresa AstraZeneca (Reino Unido), este último, a empresa prepara-se para entregar milhões de doses a partir de setembro no caso de confirmar a eficácia da vacina em condições naturais de presença da doença.

É importante que as pessoas tenham a consciência da importância da vacina na irradicação da doença. Outras pandemias, como a varíola que fez mais de 300 milhões de vítimas já foi erradicada com vacina. O sarampo (200 milhões) que até o momento ainda não existe medicamentos, mas que tem sido controlado com a vacina, a gripe espanhola (mais de 100 milhões) e a peste negra (75 milhões) também foram erradicadas com as vacinas.

Contribuição da comunidade científica no combate contra coronavírus:

Estamos a viver a ciência em tempo real. Vários esforços em diferentes campos de pesquisas científicas estão sendo feitos para que possamos ter uma ou mais terapêuticas aprovadas num curto espaço de tempo. É importante que cada país se mantenha atualizado nos estudos, para que possa definir as estratégias que permitam controlar a cadeia de transmissão da doença e a proteção de pessoas de risco.

Deste modo, considero fundamental que a Africa fomente a pesquisa sobre as emergências de forma contínua e sistemática, e não apenas no contexto pandémico. Para além, além das respostas rápidas às questões epidémicas e pandémicas, é necessário urgente apostar em pesquisas interdisciplinares sobre problemas prioritários de saúde pública de cada país.

Autor do texto:

* Professora Investigadora (UNICV).

Doutorada em Ciências Biomédicas (Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa/Instituto de Medicina Molecular João Lobo Antunes).

Artigos consultados:

https://www.nejm.org/doi/pdf/10.1056/NEJMcibr2007042?articleTools=true

https://www.thelancet.com/action/showPdf?pii=S0140-6736%2820%2931208-3

https://www.thelancet.com/journals/lancet/article/PIIS0140-6736(20)30628-0/fulltext

https://www.nejm.org/doi/pdf/10.1056/NEJMoa2021436?articleTools=true

https://www.theguardian.com/

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